A única vez que me dei o desprazer de escutar o Sergio Moro *

Rafael Dupim
1 min readSep 18, 2021

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A única vez que me dei o desprazer de escutar o Moro, ele lia uma ediçāo fulera de discursos do Ted Roosevelt. A esposa segurava a camêra do iPhone no apartamento piso frio, laminado, móveis pré moldados, jaquetinha Ralph Lauren. A pontuaçāo da leitura me fez ser transportado pra quinta série, quando o professor pedia todo mundo pra ler em voz alta e aí chegava na vez daquele coleguinha e pairava um constrangimento tácito no ar. Aquela vergoinha alheia que te solidarizava com ele pela exposiçāo desnecessária da sua clara dificuldade verbal. Pois é. Enquanto só rezávamos pro momento passar aquele colega acumulou raiva, passou em provas de múltipla escolha, se preparou mais um pouco, percebeu a força do jogo de influências,da gestão de aparências e quando você piscou ele já estava lá. Com alguma ajuda do ódio, com a franqueza inquestionável do pensamento óbvio, superou seu déficit.
Agora, ele sente o delírio,em consequência da falta de oxigênio, do alpinista que chega ao topo depois de muito escalar. Embriagado do feito, tem a sensação de que pode até se vingar: das aulas de História. Aquela que nāo o absolverá.

  • Texto de 8 de novembro de 2018

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Rafael Dupim

Professor de Jornalismo, Arte, Comunicação, Cultura e Mundo Contemporâneo/FACHA